12/04/2024

STF possibilita cobrança bilionária de PIS e Cofins sobre locação de bens

Por: Marcela Villar
Fonte: Valor Econômico
O Supremo Tribunal Federal (STF) permitiu, por maioria de votos, a
cobrança do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social (Cofins) sobre o aluguel de bens móveis e
imóveis desde 1988, ano da promulgação da Constituição Federal. O
julgamento foi finalizado na sessão de ontem.
Foram julgados dois processos em conjunto, em repercussão geral, ou seja, a
decisão vale para todas as ações judiciais em curso sobre o mesmo tema.
Segundo dados públicos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 157 processos
foram suspensos para aguardar a posição dos ministros — 92 sobre tributação
de bens imóveis e 65 de bens móveis.
As perdas para a União, se impedida de cobrar esses tributos, estavam estimadas
em R$ 36 bilhões na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) — R$ 20,2
bilhões com a locação de bens móveis e R$ 16 bilhões com a de imóveis.
O valor foi questionado por advogados, mas foi confirmado pela Procuradoria-
Geral da Fazenda Nacional (PGFN) durante o julgamento. Segundo o órgão, o
montante se refere a um ano em que deixariam de ser cobrados os tributos
federais e ao período de cinco anos retroativos que os contribuintes poderiam
requerer a devolução.
No julgamento, prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes,
acompanhado pelos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin, Kássio Nunes
Marques, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. Ficaram
vencidos os ministros Luiz Fux, Edson Fachin e André Mendonça em um dos
processos. E os ministros Luiz Fux e Edson Fachin no outro.
Como o relator de uma das ações é o ministro aposentado Marco Aurélio Mello,
o voto do ministro Mendonça, que o substituiu após a aposentadoria, não foi
computado no segundo caso. Não compareceu à sessão a ministra Cármen
Lúcia.
Moraes acatou a tese da União de que o PIS e a Cofins devem ser cobrados
sobre todo o faturamento da empresa, inclusive sobre a locação de bens móveis
e imóveis. Afirmou que desde a Constituição há essa previsão.
Já os contribuintes entendem que não há essa previsão legal porque a locação
de bens não é venda de mercadoria nem prestação de serviços, portanto, não
poderia compor a base de cálculo desses tributos.
A diferença central do voto vencedor de Moraes para os demais ministros foi o
entendimento de que o conceito de faturamento é mais amplo e abrange todo
o tipo de receita, desde 1988.
A tese fixada pelo Supremo foi a de que “é constitucional a incidência do PIS e
da Cofins sobre receitas auferidas com locação de bens móveis e imóveis
quando constituir atividade empresarial do contribuinte, considerando que o
resultado econômico dessa operação coincide com o conceito de receita bruta
ou faturamento tomados como soma de receitas oriundas do exercício das
atividades empresariais, pressuposto desde a redação original do artigo 195-I da
Constituição Federal”.
Um dos processos julgados foi da empresa Sea Container do Brasil, que aluga
contêineres e equipamentos de transporte. Ela questionava decisão do Tribunal
Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) favorável à União, que reconheceu a
tributação (RE 659412).
No outro recurso, a União questionava acórdão do TRF-3 que garantiu à Legno
Nobile Indústria e Comércio, do setor moveleiro, o direito de excluir da base
de cálculo do PIS a receita do aluguel obtido pela locação de um imóvel próprio
(RE 599658).
O relator do caso da Legno, o ministro Luiz Fux, entendia que o marco
temporal deveria ser a Emenda Constitucional nº 20/1998 e legislações
subsequentes — Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003 — que ampliaram o
conceito de faturamento de receita bruta. Antes disso, estaria restrito à cobrança
sobre a venda de mercadorias e prestação de serviços.
Já o ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso da Sea Container, havia
votado a favor dos contribuintes, pela não inclusão das receitas de locação até
o início da aplicação da Lei nº 12.973/2014, que amplificou a base de cálculo.
A partir dessa data, para o ministro, as contribuições devem incidir, desde que
a locação de bens móveis seja a atividade ou objeto principal da empresa.
O advogado Fábio Rigo Bello, sócio-gestor do Tahech Advogados, tem três
ações no escritório — de 2008, 2013 e 2022 — que discutem o tema para
varejistas. A orientação dele foi para que elas pagassem os tributos, mesmo com
a discussão judicial. "Caso se sagrassem vencedoras, iríamos recuperar os
pagamentos realizados indevidamente”, diz.
De acordo com o advogado Guilherme Yamahaki, do escritório Schneider
Pugliese Advogados, apesar de a decisão não ser boa para os contribuintes, já
era esperado. Isso porque no ano passado, ao julgar o Tema 372, que discutiu
a incidência do PIS e da Cofins sobre receitas financeiras de instituições
financeiras, os ministros também decidiram, por maioria, pelo conceito mais
amplo de faturamento.
Para o tributarista Rodrigo Caserta, sócio do escritório Brigagão, Duque
Estrada Advogados, a decisão do Supremo traz subjetividade, o que pode abrir
margem para novos litígios. "É preocupante, porque ampliaram em demasia o
conceito de faturamento, o que vai começar a gerar uma discussão futura sobre
o que é atividade empresarial importante ou relevante para a empresa", afirma.
A Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), parte interessada na
ação, diz que a legislação de 1998 e anteriores estabelecem que faturamento se
limita à venda de mercadorias e à prestação de serviços. “Os contratos de
locação dos shopping centers são caracterizados como locação de bens imóveis,
uma vez que envolvem a obrigação de dar o imóvel, não configurando uma
prestação de serviço”, afirma, por meio de nota. Para a entidade, a locação de
bens é “uma cessão temporária do direito de uso desses bens mediante uma
retribuição pecuniária”.